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Treino 3D - Corpo, Mente e Espírito, com Samorai

Bacharel em esporte, Samorai (@samorai3d) é criador do método de treinamento 3dimensional para reabilitação, prevenção e tratamento de lesões e performance. Aqui, auxilia praticantes e treinadores na busca por harmonia.
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Do que é composto o movimento?

Por Samorai
Atualizado em 15 fev 2022, 19h08 - Publicado em 15 fev 2022, 19h07

Hey, folks! Um dos meus doces favoritos é o pudim de leite. Mas, do que é feito um pudim? Leite condensado, leite, ovos, açúcar e água. Isso são seus ingredientes, porém, mesmo usando os ingredientes nas medidas certas, se usados na ordem diferente o pudim não sai do mesmo jeito. Pode sequer sair um pudim. Isso serve para todas as coisas.

Se quero fazer um filé à parmegiana, tenho que usar os ingredientes certos, na medida e ordem corretas. Se eu vario um pouquinho posso até fazer um filé do meu jeito e talvez nem mude muito, mas se eu alterar grosseiramente, é possível que saia qualquer coisa, com grandes chances de ser incomível, menos um parmegiana. Se eu te der as peças de um celular você consegue montar um? E se nem souber quais são as peças necessárias? Impossível, né?

Como educador físico, minha ferramenta de trabalho é o movimento. Entretanto, diferente dos exemplos acima, o movimento é algo nato, inerente à nossa condição. Por isso, mesmo sem saber nada, todas as pessoas se movimentam, mais ou menos do mesmo jeito e com uma certa eficiência, inclusive as portadoras de alguma deficiência. Elas conseguem alguma maneira de se movimentar e vencer as limitações, de tão natural que o movimento é.

E talvez até por isso acreditamos que todos se movem bem e que não podem se machucar a partir da forma como se movimentam. Então não damos muita importância a estudar a fundo sobre movimento e quando vamos treinar algo, basta colocar mais carga e já estamos treinando. Mas se você quer ser um profissional do movimento, você tem que saber tudo sobre ele. Afinal, quando você está treinando algum atleta, não basta que ele consiga correr, mas que ele corra o mais rápido possível ou por mais tempo ou com menor gasto energético. E tudo isso sem desenvolver alguma lesão.

Para dar qualquer passo além daquele que todos chegariam, você tem que ir mais fundo. Não basta fazer um bom pudim, você tem que saber tudo sobre doces para ser um MasterChef. E um profissional, para ser expert em movimento, tem que ao menos saber quais são os elementos que o compõe. Então, meu caro colega, essa coluna hoje é para você. Vou te contar quais são os 16 elementos pertencentes ao movimento sob a ótica do treinamento 3Dimensional.

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AÇÃO

Todo movimento para acontecer precisa estar em uma ação. Não flexão do meu quadril ou extensão da minha coluna sem que uma ação seja responsável por isso. Deixe-me ser mais claro. Para o meu joelho flexionar, preciso dar um passo, sentar, agachar, saltar ou até mesmo elevar meu joelho até o peito ou meu pé até os glúteos. Existem infinitas formas da flexão do joelho acontecer. Só não dá para acontecer sem nenhuma ação.

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AMBIENTE

Essa ação deve sempre acontecer em um ambiente. Posso agachar na areia, em uma pedra, na piscina, no cimento, na cama elástica, no aparelho de agachamento, em cima da cama, em cima da bola suíça e nos lugares mais bizarros e improváveis, só não posso agachar em nenhum ambiente.

 

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VESTUÁRIO

Todo movimento humano é realizado por uma pessoa. Na nossa sociedade é muito provável que esta pessoa esteja com alguma roupa e é muito importante eu detectar o que essa roupa favorece ou limita o movimento para que eu possa treinar o individuo sabendo o que preciso melhorar ou que vantagem eu posso ter a partir do vestuário.

Um agachamento não produz a mesma ação muscular se é feito com um chinelo ou com um salto bem alto. Adaptações terão que ser feitas pelo corpo. No Jiu Jitsu podemos lutar com kimono ou sem e, embora as regras sejam as mesmas, a luta se desenrola de uma forma completamente diferente. Então, se eu vou dar treino para alguém que lute, é imprescindível que eu saiba qual o vestuário, pois mudará a dinâmica e a lógica do meu treino. Se você acha que isso não influencia, por que está incomodado de correr com uma simples máscara no nariz e boca?

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FERRAMENTA

Boa parte dos nossos movimentos são realizados com um implemento externo. E inevitavelmente isso interfere na mecânica do movimento. Muitas vezes avaliamos um aluno na sua caminhada para detectar o porquê tem uma dor na coluna e esquecemos de levar em consideração que a maioria das caminhadas ele realiza com um celular na mão e olhando para baixo. Se o avaliarmos com essa ferramenta na mão, talvez tenhamos mais chances de detectar padrões que podem ser melhorados durante a caminhada a fim de aliviar suas dores.

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POSIÇÃO

Todo movimento acontece em alguma posição. Posso flexionar meu quadril de pé, sentado, deitado. Só não posso em nenhuma posição. E essas posições podem ser classificadas de duas formas. Posição global e características da posição. Para as posições globais, nós temos preferencialmente 6. Em pé, sentado, ajoelhado, deitado de barriga para cima, para baixo ou de lado. Todavia, cada uma dessas posições pode ser realizada de infinitas formas e isso muda a ação dos músculos e articulações envolvidas.

Por exemplo, posso fazer um agachamento na posição em pé, mas olhando para cima, para o lado ou para baixo, uma das minhas mãos pode estar para cima, para baixo, para o lado, para frente, para trás. A outra mão pode estar em uma posição diferente. Eu posso estar apoiado em uma parede, ou seja, não levar a posição em consideração pode nos levar a diferentes interpretações do movimento realizado e com isso termos um treino menos eficiente.

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BASE 3D

Toda posição terá algum contato com o planeta. Se estou de pé, preciso estar de pé em cima de algo, como já vimos no exemplo do ambiente. E esse contato com o chão ou qualquer outro objeto chamamos de base. Entretanto, essa base tem variações 3Dimensionais. Posso estar de pé com os pés na linha do meu quadril, com as pernas afastadas, com as pernas juntas, com o pé direito a frente em relação ao esquerdo e vice-versa, com os pés rodados para fora ou para dentro. E como cada pé no plano transverso age de forma independente, podemos ter posições assimétricas, como o pé direito reto e o esquerdo rodado para fora.

Essa base 3D pode acontecer com qualquer contato com o solo. Se estiver em uma posição do exercício de flexão de braço, isso também valerá para as suas mãos. Podemos ter 27 bases simétricas e 56 assimétricas. E como tudo que foi mostrado até agora, de acordo com cada base as ações do corpo mudam. Se agacho com os pés rodados para fora, tenho menos ação no glúteo do que o contrário, porque ao rodar os pés para fora deixo de ativar o glúteo no plano transverso.

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DRIVER

 

Uma característica de todos os nossos movimentos é que ele segue a lógica de drive e uma reação em cadeia. Expliquei isso melhor aqui quando falei dos princípios. (link para coluna da semana retrasada). Se isso é um princípio do movimento, significa que é imutável. Logo, todo movimento possui um driver, ou um guia, um orientador. Sendo assim, o driver passa a ser uma característica do movimento. Este driver também tem três classificações.

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O driver físico, dado pelas forças físicas, que são responsáveis por qualquer movimento como disse aqui (link para a coluna sobre os princípios do movimento, 3 colunas atrás). O driver anatômico, que é a parte do corpo que inicia a reação em cadeia. Se dou um soco com a mão direita, então o driver passa a ser minha mão direita, mas se mudo de mão, agora o driver é a mão esquerda. E toda a cadeia de reação que vem na sequência deste movimento é alterada. E temos o driver emocional, quando a origem do movimento tem uma característica emocional que o influencia, por exemplo, ao ouvir um estouro, rodo imediatamente meu pescoço o mais rápido possível para o local de onde saiu, porque tive uma experiência negativa com uma explosão uma vez e isso me influencia hoje. Uma outra pessoa sem essa influência talvez faria esse movimento de outra forma. Logo, cada movimento aconteceu de uma forma diferente porque temos relações emocionais diferentes.

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ANGULAÇÃO

 

Do ponto de vista da física, o driver anatômico sempre estará em algum lugar no espaço. No exemplo acima falei de um soco com a mão direita. Mas esse soco pode ser dado em diferentes angulações. Poderia ser dado para frente, para qualquer um dos dois lados e até para trás. Cada angulação geraria uma reação em cadeia diferente. Por isso preciso determinar em qual ângulo acontece essa ação.

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ALTURA

Podemos, para efeito de exemplo, dizer que o ângulo do soco referido acima foi para frente. Porém, ele pode ser em diferentes alturas. Eu posso dar um soco acima da cabeça, na altura do nariz, do queixo, do peito, do umbigo e até mesmo do chão e todos esse seriam para frente. Então, determinar apenas a angulação não seria suficiente. Preciso determinar também a altura.

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DISTÂNCIA

E até se eu determinar o ângulo e a altura deste soco, por exemplo, para frente e na altura do peito, ele pode ser mais perto de mim ou até bem longe, o que obrigaria meu corpo a se curvar todo à frente, ou seja, alterando novamente a reação em cadeia. Sendo assim, é necessário determinar também a distância deste driver para que eu tenha uma precisão deste movimento e com isso poder determinar a reação em cadeia correta a ser executada. Para exemplificar, para eu caracterizar esse soco, eu poderia dizer que ele é com a mão direita, para frente na altura de 1,5 metros e a 2 metros de distância. Pronto, você já sabe exatamente como executar.

 

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CARGA

Todo movimento possui uma carga. Nem que seja o peso corporal. Mas, em geral, como a maioria está sempre com um implemento externo, seja ele um celular, uma mochila, uma sacola de compras ou até mesmo um halter, o peso influencia a mecânica do movimento. Agachar com o peso corporal é diferente de agachar com 200kg. Essa característica é a mais levada em consideração nos treinamentos tradicionais, enquanto que para o treinamento 3Dimensional ela é tão importante quanto todas as outras.

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VELOCIDADE

Todo movimento, por ser dinâmico, tem uma velocidade. A velocidade por ser uma força física influencia todas as outras que possuem velocidade na sua fórmula, como a inércia e a quantidade de movimento. Mas também afeta gravidade e força de reação do solo. Todas essas variáveis exigem do corpo uma adaptação mecânica. Se estou fazendo uma curva na pista de atletismo a 8 km/h a amplitude da eversão do meu tornozelo esquerdo tem que ser muito menor do que se eu fizer essa curva a 15 km/h, para se ajustar à força centrípeta que age nessas duas curvas.

 

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A duração é importante para definir por quanto tempo o corpo está exposto a esse movimento e com isso avaliar sua capacidade de executar com eficiência ao longo deste tempo. Esta característica influencia muito o treinamento. Se eu tenho que dar só um soco, meu treino será diferente do que se eu tenho que dar socos diversos por 12 rounds em uma luta de boxe. Por isso é tão importante definir a duração.

 

 

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RITMO OU FREQUÊNCIA

Mesmo sabendo que você dará socos por 12 rounds, se não souber qual a frequência disso sua informação é imprecisa. Para adequar seu treinamento, o ritmo e a frequência são necessários para avaliar as capacidades com precisão e direcionar o treino para que isso seja entregue. Uma coisa é dar 10 saltos seguidos e outra é dar 10 saltos com intervalo de 5 segundos entre eles.

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AMPLITUDE E SEQUÊNCIA

Como o movimento pode ser realizado com diferentes combinações, dependendo desta combinação eu vou gerar mais ou menos amplitude na mesma articulação. Eu posso fazer um agachamento usando mais ou menos o quadril e o joelho, sem que isso altere o driver. Isso pode acontecer por uma regra de uma modalidade esportiva ou porque o vestuário impõe uma forma diferente de combinar. Ou por qualquer outra razão ou até mesmo sem nenhuma, só porque o executante faz sem nenhuma consciência. Nesse caso é importante detectar a sequência e a amplitude a fim de avaliar e treinar de acordo com o necessário e/ou a melhor performance.

 

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ALTERAÇÕES EMOCIONAIS, FISIOLÓGICAS OU ENERGÉTICAS

Quando falamos em 3D não podemos deixar tudo isso de fora, né? Para você entender o que é essa característica, vou usar um exemplo. Pense em uma pessoa caminhando com raiva, ou relaxada na praia, ou com medo, ou com muito frio, ou muito apertado para ir ao banheiro. É fácil visualizar que todas essas caminhadas foram diferentes, mas as caraterísticas anteriores pouco se alteraram e, se assim o fizeram, foi porque a ação delas também era uma resposta a essas condições apresentadas. Então precisamos levar isso em consideração quando vamos avaliar ou treinar.

Um lutador que compete no máximo do estresse emocional também tem que treinar dentro dessas condições. Cansei de ver lutadores maravilhosos nos treinos e péssimos nas competições, porque ao estarem sob estresse se movimentavam de formas inadequadas, mas nas avaliações feitas sem esse estresse não eram detectados esses padrões. Logo, não tinham nada a corrigir ou aperfeiçoar.

Ufa! Um movimento é composto de muita coisa mesmo. E essas variações podem determinar sucesso e fracasso de um programa de treinamento. Por isso que muita gente deixa de evoluir ou não encontra causa para suas dores. Até porque, se você observar apenas carga e duração, que é o que todo treinamento tradicional faz, você limita muito suas possibilidades, o que faz com que a maioria das respostas estejam nas características que foram negligenciadas e jamais corrigidas. E muitas vezes os ajustes são muito simples, mas por não observá-los você convive com dores pela vida toda.

Forte abraço,
Samorai 

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