Temos dentro do nosso organismo um sistema denominado Sistema Endocanabinoide (SEC), que é responsável pelo equilíbrio do nosso organismo e tem funções no controle de situações como dor, alteração de humor e sono e inflamação.
O SEC inclui receptores para substâncias que nós mesmos produzimos, os chamados endocanabinóides, que se assemelham aos canabinoides presentes na planta cannabis, os chamados fitocanabinoides.
A cannabis é conhecida por conter mais de 450 compostos distintos, incluindo mais de 100 fitocanabinoides. Dois desses fitocanabinoides amplamente estudados nas pesquisa médicas são o tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD).
O aparelho reprodutor feminino contém uma das maiores concentrações de receptores canabinóides do organismo. E é através do conhecimento das ações do sistema endocanabinoide no órgão reprodutor feminino que podemos pensar em utilizar os fitocanabinóides com o objetivo de diminuir dor, inflamação e proliferação do endométrio para fora do útero, além de regressão das lesões já existentes.
Além disso, existe uma ação no sistema nervoso central que é capaz de modular a percepção de dor, reduzindo a intensidade com que a dor é percebida por essas pacientes. Existem evidências indicando que os canabinoides têm efeitos analgésicos, e os mesmos já são amplamente utilizados em dor crônica.
Estudos apontam que pacientes com endometriose apresentam alteração no SEC e uma queda nos receptores do sistema endocanabinóide, responsável por equilibrar o organismo para que este realize suas funções corretamente.
Essa deficiência clínica subjacente de endocanabinoides pode ser a causa do crescimento acentuado da endometriose e da intensificação da dor. Portanto, ao tratar essa deficiência clínica com canabinoides da planta, como o THC e o CBD, pessoas com endometriose podem ter alívio de sintomas relacionados.
Um periódico da Sociedade de Endocrinologia Europeia publicou uma pesquisa de 2013 que constatou que o CBD desenvolve ações importantes nos órgãos reprodutores femininos, regulando algumas funções como a migração e a proliferação de células do endométrio. O canabidiol bloqueia a ativação do receptor responsável pelo deslocamento das células.
Outro estudo evidenciou que muitas pacientes usam cannabis de maneira ilegal para gestão de suas dores. Essas pacientes relatam melhora da dor e redução dos medicamentos prescritos. Por isso, a necessidade urgente de estudos mais bem conduzidos e da conscientização da sobre o uso medicinal da planta (que, assim como qualquer outro tratamento, deveria ser prescrito e acompanhado por médicos).
Estudos em animais também demostraram que os receptores canabinoides estão presentes nas fibras nervosas que inervam lesões de endometriose, e que o bloqueio desses receptores diminuiu o tamanho de nódulos de endometriose – sugerindo um potencial uso da cannabis medicinal no tratamento também da adenomiose.
Ainda que sejam necessários mais estudos sobre a relação dos canabinoides com o aparelho reprodutor feminino, sabe-se que o CBD tem propriedade analgésica e anti-inflamatória, e, portanto, poderia ser utilizado para o alívio de alguns dos sintomas para endometriose. O seu uso tem aliviado as dores crônicas da inflamação, os espasmos, as náuseas e vômitos, proporcionando aos pacientes mais qualidade de vida.
As evidências são insuficientes em relação à dose, formulações e vias de administração. Necessitamos de estudos mais bem desenhados para confirmação de eficácia e segurança relacionadas às doses e combinações dos fitocanabinóides.
Dra. Beatriz Jacob, médica estudiosa da cannabis para fins medicinais. Instagram: @dra.beatrizjacob