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Maju de Araújo: da quebra de padrões à representatividade nas passarelas

Capa da edição de junho de Boa Forma, Maju de Araújo fala sobre desafios se tornar a primeira modelo brasileira com síndrome de Down

Por Ana Paula Ferreira
Atualizado em 21 out 2024, 16h42 - Publicado em 12 jun 2023, 09h00

Maju de Araújo, de 20 anos, é mais uma prova de que os padrões existem para serem quebrados. Como jornalista, peço desculpas pelo clichê logo de início. Mas como falar da jovem com síndrome de Down e baixa estatura que se tornou uma modelo internacional de passarela, se não exaltando sua conquista ao quebrar as barreiras impostas pela sociedade?

Foram apenas três anos entre sair de uma internação que quase tirou sua vida e se tornar a primeira modelo brasileira com Down a desfilar dentro e fora do país – o que a fez colher não só frutos para si mesma, como também para outras pessoas com deficiência diante de sua representatividade mundo afora.

No dia em que conversamos, Maria Júlia chegou à entrevista com muita simpatia e alto astral, trazendo um lado mais doce e cheio de leveza. Não demorou, porém, para ela mostrar que a atitude que embala seu caminhar pelas passarelas e que vem lhe ajudando a conquistar cada vez mais o mundo da moda também está presente em sua vida pessoal.

“Mãe, posso falar? Obrigada!”, ela disse para “tomar as rédeas” logo que percebeu que Adriana Araújo, sua mãe, se preparava para responder uma pergunta direcionada a ela.

Foi assim, inclusive, que Maju, junto de sua mãe e suas irmãs mais velhas, Ana Lua e Larissa, tem aberto seus caminhos para o sucesso.

“A Maju é o que é graças à insistência pelo espaço dela, por não abaixarmos mais a cabeça de jeito nenhum. […] E é tudo mérito dela! É ela que está na passarela, ela que faz as publicidades. Eu só acreditei nela. Ela só precisava disso”, contou Adriana.

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A seguir, você confere o bate-papo de Boa Forma com Maju de Araújo e Adriana Araújo.

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(Pedro Machado/Mynd8/BOA FORMA)

Bem-estar e beleza em dia

Em meio à rotina profissional atribulada, Maju tem seus truques para conseguir relaxar o corpo e a mente. Música, treino e muita água fazem parte dos rituais que a ajudam a viver momentos de bem-estar.

Apesar de curtir um momento mais relax, contudo, Maju assume que adora e não abre mão de estar bem produzida, com direito a maquiagem, cabelo arrumado e unhas bem feitas. Para isso, ela também conta com o suporte da família, em especial da irmã mais velha, Larissa.

Quando falamos em bem estar, o que você gosta de fazer?

Maju: Eu gosto de malhar e faço musculação sempre que dá. Também gosto de fazer dieta, cantar e ouvir música. Meu cantor preferido é o Michael Jackson! [Ela mostrou o fundo da tela de seu celular com a foto de Rodrigo Teaser, cover brasileiro do astro pop, que a modelo disse ser muito fã.]

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Adriana: Quando a gente está viajando muito, tentamos adequar as atividades físicas dela. Agora vou buscar a ajuda de um personal trainer para passar um treino para quando ela estiver fora do contexto de casa, para não ficar sem fazer atividade nenhuma, porque é muito importante.

Quais são seus truques para ficar mais calma e relaxada em momentos de estresse?

Maju: Eu sou um pouquinho nervosa. Mas eu gosto de tomar chá e fazer meditação. Também tomo bastante água. Eu amo água!

Você se considera uma pessoa vaidosa? Tem uma rotina de cuidados com o rosto, corpo e cabelo?

Maju: Eu gosto muito de fazer uma make e arrumar o cabelo. Minha irmã [Larissa] que faz minhas makes, produz meus looks. Também faço as unhas, gosto delas grandes, com alongamento, bem chique.

Como foi mudar a cor do cabelo para ruivo?

Maju: Eu gostei. Tenho que pintar de novo meu cabelo, mas agora quero colorido, com uma mecha colorida aqui embaixo [na nuca].

Você gosta de mudar? Não tem medo?

Maju: Tenho só um pouquinho de medo, mas eu gosto sim!

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Maju de Araújo encarou preconceitos para se tornar modelo
Maju de Araújo encarou preconceitos para se tornar modelo (Pedro Machado/Mynd8/BOA FORMA)

Carreira em ascensão

Primeira brasileira com síndrome de Down a se tornar embaixadora de L’Oreal Paris, modelo de passarela na Fashion Week de Milão, capa da Forbes na lista Under 30 de 2021, destaque no São Paulo Fashion Week em 2022 e 2023…

Em apenas três anos de trabalho, Maju conquistou feitos grandiosos como modelo e, consequentemente, como militante da causa das pessoas com deficiência, por sua representatividade.

Com seus 1,49 metros de altura, a jovem, de fato, quebrou barreiras e preconceitos ao cruzar passarelas dentro e fora do Brasil, provando que esse é um espaço em que cabem todos os tipos de pessoas. E isso, segundo ela, é só o começo.

Você sempre teve vontade de ser modelo, Maju?

Maju: Sim, desde pequenininha!

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Adriana: Ela sempre teve o desejo de modelar. A gente tem fotos muito antigas, de quando a gente participava de alguns retiros de igreja, e nesses lugares ela modelava, colocava guardanapo na cintura, toda estilosa.

Como você se sentiu na primeira vez que pisou na passarela?

Maju: Fiquei emocionada , muito feliz e com frio na barriga. Eu chorei muito, mas foi muito legal, foi tudo! E aí nunca mais parei.

Quais foram as maiores dificuldades enfrentadas nesse tempo como modelo?

Adriana: A parte mais difícil que a Maju precisou enfrentar foi o preconceito. O preconceito ainda é o maior obstáculo de todos em relação a oportunidades. Não é comum, ainda, vermos um casting para passarela com pessoas com síndrome de Down ou outra deficiência, então sentimos que ainda estamos muito longe do que é a inclusão de verdade.

Você alcançou conquistas profissionais grandiosas. Como foi quebrar essas barreiras no mundo da moda, que ainda segue padrões antigos?

Maju: Me emocionei bastante no desfile de Milão, chorei muito também. Me aplaudiram lá. Eu fiquei feliz demais!

Adriana: Sabemos que nos países da Europa o índice de aborto de gestações de síndrome de Down é muito grande. Então, estar ali dentro dessa semana de moda foi bastante importante, porque pra gente é um lugar bem difícil de acessar. Vimos a Maju como um Davi no meio de Golias. Ela quebrando, de fato, todo esse rótulo. As pessoas voltaram o olhar para ela. Ninguém esperava, né? Lá na semana de moda de Milão, uma pessoa com síndrome de Down, com uma estatura muito baixa…

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Como vocês lidaram com os “nãos” que já receberam?

Adriana: Foi muito difícil. Nunca vi impossibilidades na Maju, muito pelo contrario. Na infância, tudo se torna muito mais fácil, mas na medida em que eles crescem, você se depara com o preconceito velado. E aí é muito triste, porque você vê através de olhares… Mas eu, hoje, como militante junto com a Maju, descobri que temos que lutar por nossos direitos. Hoje ela é o que é graças a nossa insistência pelo espaço dela e por não abaixarmos mais a cabeça de jeito nenhum.

Houve algum momento muito marcante de preconceito sofrido pela Maju?

Adriana: Me posicionei pela primeira vez na escola de modelos. Queríamos que ela entrasse nesse mercado de fato, formada. Falaram que não estavam adaptados para ela, não queriam aceita-a, mas falei que se não aceitassem, eu os processaria. Eu virei uma leoa pela primeira vez, mas, por dentro, estava chorando por passar mais uma vez por isso.

Ela se formou e foi lindo! Eles [a escola] não fizeram nada por ela. Bateram nas minhas costas e desejaram uma boa caminhada. Essas coisas foram tão importantes! Elas me deram garra, gás, para que a gente mostrasse que íamos conseguir. E é tudo mérito dela! É ela que está na passarela, ela que faz as publicidades. Eu só acreditei nisso. Ela só precisava disso.

Maju, qual é o seu grande sonho para a sua carreira?

Maju: Desfilar na semana de moda de Paris! E também gostaria de ter a experiência de trabalhar como atriz, atuar em uma série.

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(Pedro Machado/Mynd8/BOA FORMA)

Fora do mundo da moda

Apesar de ter se tornado uma estrela das passarelas, Maju também tem sonhos e desejos comuns de outras jovens de 20 anos.

Nesse aspecto, por enquanto, os planos já estão bem definidos: curtir a família e os amigos, namorar e morar fora com o futuro marido.

Como é sua relação com a sua família? Você se dá bem com suas irmãs?

Maju: Nós somos amigas. Não brigamos nunca [disse com ironia, rindo com Adriana]. Ah! Minha irmã Larissa me ensinou a falar em libras, olha: “Te amo, irmã” e “linda” [ensinando os sinais].

Durante esse período de trabalhos, você conheceu ou fez amizade com outras pessoas síndrome de Down?

Adriana: A Maju durante muito tempo ficou fora do contexto da inclusão. Ela passou por várias fases em relação à saúde, passou por uma cirurgia no coração, um coma… Então ela viveu uma montanha russa. Agora que ela trabalha, tem autonomia, é o momento que ela está começando a preparar essa oportunidade de conexões.

Foi a primeira vez que ela dormiu sozinha na casa de uma amiga, que foi a Ivy, filha do Romário [que também tem síndrome de Down]. Agora, foi em sua primeira festa sozinha com amigos com Down. Eu não fui, não me permitiram ir [risos]. Isso pra mim foi muito desafiador e muito importante, porque eu sempre coloquei a Maju em uma redoma de proteção por conta de olhares, porque às vezes falta um pouco de sensibilidade, né?

E você já namorou? Tem o desejo de ter uma família?

Maju: Já namorei sim, mas agora estou solteira [mostrando o dedo anelar sem aliança]. Estou paquerando… Gostaria de casar e ir embora para longe com meu marido [risos].

Adriana: Está doida para me ver pelas costas. Eu sou a chata, que coloca as regras, bota o horário para acordar, gosto que ela malhe… Aí ela quer me ver longe [risos]. Eu sei das limitações dela e sei que ela precisa da rotina, das atividades diárias para ela evoluir cada vez mais. Acho que a socialização vinda dessa rotina também é muito importante, porque se aprende a questão de limites. Quando você está convivendo apenas no seu contexto familiar, você não é confrontado. E quando você é confrontado, é muito importante, pra todo mundo. Então a gente aprende a respeitar, aprende os limites.

FOTOS: Pedro Machado/Mynd8/@melinatavarescomunicacao

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