Cresci com uma relação muito complicada com a comida, exercícios e o corpo, cresci na geração anos 90 em que o corpo GORDO, fora do padrão, era sinônimo de repulsa. O inconformismo me levou aos meus meios de trabalho de hoje: a comunicação, a escrita, a influência e a imagem de uma forma positiva…
Mas qual não foi a minha surpresa depois de 16 anos trilhando esse caminho e perseguindo uma atmosfera principalmente feminina, mais livre, me deparar em 2024 como espectadora de uma consulta nutricional de uma adolescente “fora do padrão”…
Me teletransportei para 2004, ano em que quase morri pra me encaixar nos moldes sociais aos 17 anos seguindo uma força tarefa com o nome “xô gordura” composta por um endocrinologista, uma nutricionista e um personal trainer, que tinham como premissa encarar o espelho e lembrar que o corpo que eu tinha era repulsivo.
Um coquetel perigoso de remédios, uma dieta impessoal e extremamente radical e os exercícios em excesso me levaram ao colapso físico e à ferida emocional que ainda curo…
Mas voltando aos tempos modernos, onde online “aceitamos, entendemos, respeitamos e empoderamos” o “diverso”, estava eu naquela sala, assistindo a uma cena como num espelho velho…
Uma adolescente gorda, ouvindo atentamente as instruções para o corpo perfeito em 60 dias, com frases muito marcantes como “Evitar o convívio para não perder o foco”, “Poder escolher as roupas e não ser escolhida por elas”, ”Corpo bom se conquista na adolescência”, ”Se você sobreviver a essa primeira semana você sobrevive a qualquer coisa”.
Eu sinceramente morri um pouco, com um misto de gatilhos, insuficiência, insignificância, cheguei a pensar que talvez seja isso ser mulher: ODIAR, ESPREMER, ESCONDER, SOFRER, EVITAR…
Vi nascer ali mais alguém que vai lidar com a comida, os exercícios e a própria imagem de maneira dolorida e distorcida. Vi ali, em 60 minutos de consulta, medos e inseguranças pularem como pop-up naquela cabecinha que poderia desenvolver uma relação de amor com a nutrição.
O movimento e a imagem se reduzirem a jejum, solidão e vergonha ao assinar um contrato de compromisso onde é proibido falhar.
A conclusão de tudo isso?
O que realmente estamos querendo? Viver a vida tão breve à flor da pele, descobrir o mundo e se emocionar? O que estamos querendo ainda em 2024 é uma cama de pregos que, NÃO importa quanto custe, pois nos deixe bonitas na foto, nos renda elogios vazios, e a dor de ainda assim não pertencer… Ainda estamos criando exércitos de médicos que machucam, mulheres que se odeiam, mas tem polaroides magras penduradas na geladeira.