Eutonia: conheça o método que acaba com dores de décadas

Nem massagem nem fisioterapia: a abordagem sutil ensina a equilibrar o tônus para tratar casos complexos, como de hérnia de disco, e aliviar tensões

por Larissa Serpa Atualizado em 18 nov 2022, 12h47 - Publicado em
7 abr 2021
09h00

“O indicado para seu caso é uma arriscada cirurgia na coluna vertebral.” Imagine, aos 19 anos de idade, ouvir essas palavras do seu médico, junto a uma perspectiva de pós-operatório de seis meses sem sair da cama e uma lista de movimentos e posições que você não poderia nunca mais fazer.

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Foi o que aconteceu com Paula Baptista, na época estudante do ensino médio, após uma viagem de barco que ocasionou uma lesão. “Eu e outras crianças sentamos na ponta da lancha, que parecia ser a parte mais emocionante. A cada acelerada, nós pulávamos. Quando veio uma onda maior, eu pulei e caí sentada. Lembro de sentir muita dor e passar o resto do passeio deitada. Foram 15 dias assim, deitada sem conseguir sustentar o corpo em pé”, conta.

“No cursinho para o vestibular, a carteira gerou uma pinçada de nervo e eu cheguei a perder o movimento dos braços por um tempo.”

O raio-x não mostrou nada de errado e Paula continuou sentindo a dor por anos. “Lembro de ter vezes que deitei no chão da sala, quando não me deixaram sair da aula. Anos depois, no cursinho para o vestibular, a carteira gerou uma pinçada de nervo e eu cheguei a perder o movimento dos braços por um tempo.”

Ao investigar mais a fundo, um exame de tomografia indicou que o disco, que fica entre as vértebras para proteger e amortecer impactos, estava alojado dentro de uma fratura na lombar, não permitindo que o osso se recuperasse.

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O indicado pelo médico foi a cirurgia, mas Paula buscou alternativas. Fez acupuntura e fisioterapia. Obteve progresso mas não o fim da dor. “Foi lá pelo 4º ano da graduação em Psicologia que ouvi pela primeira vez falarem em Eutonia. Uma amiga me indicou quando eu comentei das constantes dores que já sentia há 10 anos. Eu estava cansada de tantos tratamentos e confesso que fui à primeira sessão munida de desesperança.”

Nas primeiras sessões com Tereza Gomes, eutonista, Paula diz ter sentido pequenos raios da mão da Tereza, toques muito sutis que disparavam uma espécie de corrente elétrica em seu corpo. “As correntes me indicavam caminhos e eu ia tirando o foco de atenção apenas da coluna e ampliando a visão do meu corpo. Não me lembro ao certo. Depois de duas ou três sessões eu já conseguia me deitar no chão (antes só na maca) e o trabalho foi saindo do contorno e da sensibilidade da pele para a percepção dos meus ossos”, lembra Paula.

“Fui aprendendo a ‘abrir espaço’ entre as minhas vértebras lombares com o movimento mínimo sugerido pela eutonia.”

“Em dado momento do processo, fui apresentada a uma coluna vertebral. A Tereza tinha uma réplica. Eu nunca tinha visto uma coluna que não fosse uma imagem chapada de Raio-X. Aquilo mexeu muito comigo pois foi a primeira vez que eu me permiti entrar em contato com a minha coluna vertebral com uma intenção de escuta e pesquisa e fui aprendendo a ‘abrir espaço’ entre as minhas vértebras lombares com o movimento mínimo sugerido pela eutonia.

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Após uma década de dores, Paula podia finalmente viver uma vida plena.

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O QUE É EUTONIA

Perceber o espaço que cada tecido, incluindo cada osso, ocupa em seu corpo, é importante na Eutonia |
Perceber o espaço que cada tecido, incluindo cada osso, ocupa em seu corpo, é importante na Eutonia | (Klaus Vedfelt/Thinkstock/Getty Images)

“Definir o que é eutonia é um problema. Mas, no geral, posso dizer que é uma abordagem de trabalho corporal que busca um equilíbrio dos diferentes tecidos do corpo, principalmente ossos, músculos, pele e ligamentos”, explica Andréa Bomfim Perdigão, eutonista formada pela primeira turma do Brasil, há 26 anos.

A palavra eutonia, de origem greco-latina, significa “equilíbrio do tônus”. “A grosso modo, o tônus é o grau de contração do tecido, a eutonia serve para equilibrar esse tecido e ensiná-lo a contrair quando precisa ou relaxar quando precisa”, diz Andréa.

Ela visa nos fazer perceber como cada tecido do nosso corpo está, além de onde ele está, que espaço ocupa no seu corpo. “Tendo essa consciência corporal, é possível ter uma maior autonomia, conseguindo controlar suas tensões e até refinando seus gestos. É por isso que ela é procurada não só para resolução de dores, mas também por atores e bailarinos que precisam de um refinamento em seus movimentos”.

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OS PRINCÍPIOS DA EUTONIA

É como uma fisioterapia ou massagem?

Dores podem se instalar no seu corpo por fatores físicos ou mesmo emocionais |
Dores podem se instalar no seu corpo por fatores físicos ou mesmo emocionais | (Klaus Vedfelt/Thinkstock/Getty Images)

Os três utilizam o toque ou movimentos para atacar um problema mas, enquanto a fisioterapia foca apenas no local determinado de dor, a eutonia trabalha o corpo como um todo, como explica Tereza Gomes, que atendeu Paula tantos anos atrás. “Não que seja uma ‘concorrente’ da fisioterapia de nenhuma maneira, o ideal é que seja feito um trabalho complementar”, adiciona Andréa.

Já quanto à massagem, a diferença está não apenas no toque – que na eutonia é sutil e não com objetivo de “amassar” o músculo -, mas também na abordagem. Receber uma massagem é uma atividade passiva, já o toque da eutonia é para te fazer perceber seus tecidos, seu músculo, seus ossos, sua pele, e tomar conta de cada um, para controlá-lo e evitar tensões ou pesos desnecessários.

É o que acontece quando você levanta os ombros ao digitar no computador, por exemplo. Você está aplicando uma intensidade que não é necessária para aquela atividade. A eutonia te ensina a dosar. “Eu tive uma cliente que chegou com muita dor no trapézio. O estresse de trabalho a fazia contrair a região sem perceber. O que ela me relatou é que, tendo essa percepção total dos seus tecidos, ela hoje consegue perceber quando está começando a fazer essa contração desnecessária no trapézio para frear, antes que a tensão se instale”, conta Andréa.

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OS BENEFÍCIOS DA EUTONIA

A importância do toque

Na Eutonia, o auto-toque tem um importante papel para seu conhecimento |
Na Eutonia, o auto-toque tem um importante papel para seu conhecimento | (Klaus Vedfelt/Thinkstock/Getty Images)

“Na eutonia, a pele também é um dos tecidos mais importantes. É preciso perceber a pele como esse invólucro, que dá continência ao nosso corpo em relação ao resto do mundo. Ter essa noção corporal traz benefícios inclusive emocionais e psicológicos comprovados pela ciência”, destaca Andréa Bomfim Perdigão. De fato, diversos estudos relacionam o toque da pele a uma diminuição na depressão.

“O terapeuta me falou que eu não poderia mais usar salto, que eu adorava, e que eu teria que fazer alongamentos constantes. Aquilo me deprimiu ainda mais, me senti tendo que aceitar mais um diagnóstico ruim, só via ‘nãos’ na minha frente.”

Esse foi o caso de Cristina Pietraroia. Em 2012, ela teve uma crise de depressão que veio acompanhada de exaustão no trabalho e, para piorar, uma lesão em um dos tendões na região do tornozelo. “Eu passei vários dias fazendo fisioterapia e o terapeuta me falou que eu não poderia mais usar salto, que eu adorava, e que eu teria que fazer alongamentos constantes. Aquilo me deprimiu ainda mais, me senti tendo que aceitar mais um diagnóstico ruim, só via ‘nãos’ na minha frente.”

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Foi por indicação da sua acupunturista que ela começou a atender com Andréa e viu o problema no tendão tão bem resolvido que voltou a usar salto, fazer ginástica e até começou a correr. “Mas o tratamento, para mim, não foi só físico. O toque da Andréa, seu contato, me ajudou muito na depressão. Foi além de apenas uma terapia corporal, a intensidade da atenção que recebi e a percepção de mim mesma me trouxeram um cuidado que vai além do físico. A eutonia é mais que só uma técnica de tratamento de dor, ela é uma atenção completa à pessoa como um todo.

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COMO FUNCIONA UMA SESSÃO DE EUTONIA

A eutonia trabalha até mesmo em dores crônicas, como a de hérnia de disco |
A eutonia trabalha até mesmo em dores crônicas, como a de hérnia de disco | (Klaus Vedfelt/Thinkstock/Getty Images)
  • Tratamento para dor

Através de toques delicados e gentis, o eutonista vai tocando os tecidos começando por onde a pessoa sente dor. “Eu vou sentindo: como estão os músculos em relação aos ossos — soltos ou tensos? Então vou soltando esse tecido antes de passar para o resto do corpo”, diz Andréa. “Mesmo que a sua dor seja nos ombros, é provável que você a instale ali por um encurtamento em outra áreas que te faz tensionar a região.”

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O toque na eutonia é leve e focado nas sensações |
O toque na eutonia é leve e focado nas sensações | (Veronique Beranger/Thinkstock/Getty Images)

Geralmente, o tratamento é contínuo, mas algumas pessoas sentem resultados em uma só sessão, dependendo do grau de dor e lugar. “Se o pescoço travou, poucas sessões conseguem resolver mas uma pessoa com hérnia de disco, por exemplo, pode levar até 6 meses”.

Também nesta sessão, é possível utilizar objetos que vão ajudar a sentir melhor seus tecidos, como bolinhas macias, bambus, algodão, pincel, sementes, meia com arroz. Depois, você é estimulado a fazer micro movimentos para perceber o tecido.

Preciso de aval médico?

Não. Como explica Andréa, a eutonia não é algo agressivo, não vai usar toques ou movimentos pesados e por isso, não tem contra-indicação. “Como não é conhecida, a eutonia, na verdade, acaba sendo quase a ultima tentativa, para quem já atendeu com um médico, tentou fisioterapia, acupuntura…”

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    Aluna em um grupo de eutonia analisa uma réplica de crânio da face |
    Aluna em um grupo de eutonia analisa uma réplica de crânio da face | (Instituto Brasileiro de Formação em Eutonia/Reprodução)
    • Em grupo
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    As sessões em grupo servem não para tratar uma dor mas para aprender a controlar seus tecidos e evitar que as dores se instalem, além de ter uma consciência maior do seu próprio corpo e movimentos.

    “Nessas aulas, além de mostrarmos réplicas em tamanho real dos tecidos, para a pessoa visualizar melhor, ela também se toca muito: apalpa os ossos do corpo e aprende o espaço que eles ocupam. O mesmo com músculos, ligamentos, pele…”, explica Andréa.

    Nessas sessões, o profissional te indica os movimentos apenas verbalmente, sem demonstrar como ele deve ser feito “Nunca é um trabalho baseado na imitação do movimento porque ele deve vir da sua percepção pessoal do próprio corpo”

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    Eutonia na quarentena

    Quer fazer uma sessão online para se conhecer melhor? O projeto EUTONIA NA QUARENTENA oferece aulas online gratuitas todas as quintas às 19h ou sextas às 9h. Basta acessar institutodeeutonia.com.br/eventos/projeto-eutonia-na-quarentena

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    Seja em grupo ou como tratamento individual, o que todos os pacientes relatam é que o impacto dura uma vida toda. “O processo de autonomia de cuidado que a eutonia me deu ninguém tira. O despertar da atenção ao corpo, a potência do sutil. Tudo isso segue comigo e já não sinto mais dores nas costas. Hoje, consigo enxergar e cuidar dos meus limites antes de ultrapassá-los”, finaliza Paula que, após se impressionar com os resultados notáveis do seu tratamento, se profissionalizou como eutonista.

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    Esse especial faz parte da edição de abril de 2021 de Boa Forma,
    que traz a ex-ginasta olímpica e influenciadora esportiva Daiane dos Santos em sua capa.

    Clique aqui para conferir os outros especiais dessa edição.

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