“O meu corpo não me define”, diz Rebecca, do vôlei de praia
Aos 28 anos, Rebecca Cavalcante fala sobre autocuidado, a vida como atleta de alta performance e os objetivos para o futuro.
Na Olimpíada de Tóquio, Rebecca Cavalcante e a dupla, Ana Patricia Ramos, finalizaram a parceria ocupando o quinto lugar no ranking do Vôlei de Praia. Aos 28 anos, além das medalhas e conquistas anteriores, a atleta compartilha as quadras e o amor pelo esporte com a filha, Isabella, de 8 anos. E, como é de se esperar, sua rotina é tão agitada quanto o set decisivo de uma partida importante.
“A vida de atleta profissional é incrível, mas tem muita dificuldade, seja na modalidade que for ou na profissão que você escolher”, diz ela à Boa Forma. “Acho que a grande vantagem é fazer o que eu amo. Eu cresci no vôlei, minha família toda jogou, e eu consegui chegar ao alto rendimento. Eu tenho oportunidades incríveis, realizo muitos sonhos através da minha profissão, mas também envolve muito sacrifício. Físico e emocional. Ser atleta é ter que estar 100% sempre e muitas vezes isso é bem difícil.”
A atleta conta, no entanto, que de todos os desafios que enfrenta no esporte o mais difícil é ficar longe da família e da filha. A história da pequena Isabella, aliás, é bastante marcante na vida de Rebecca. Ela engravidou, de forma não planejada, em um momento bastante difícil. Ainda assim, leva no coração a certeza de que a filha foi amada desde o primeiro momento.
“Naquela época, eu começava a sonhar com os Jogos do Rio, e os planos foram adiados. Mas, sem dúvidas, foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida. Minha filha é a razão de tudo”, diz. “Claro que foi muito difícil em muitos momentos. A maternidade é árdua, principalmente nos primeiros anos. Mas eu sempre contei com uma boa rede de apoio, com meu marido sempre, então consegui levar bem”.
Rebecca conta que, hoje, Isabella já entende sobre a profissão da mãe e que é muito bom tê-la na torcida. Sempre que pode, escolhe levar o marido e a filha para os treinos, o que garante uma dose extra de calma para se concentrar no esporte. “Eu sei que faço parte de uma minoria que conseguiu conciliar a profissão e a maternidade de uma forma legal. Por isso, sou muito grata a meus pais e minha família em geral, que me apoia muito”, reflete.
Críticas sobre o corpo e a força de uma atleta olímpica
Durante a Olimpíada de Tóquio, Rebecca tomou uma decisão: não manter o Instagram instalado no celular. A ideia era deixar as redes sociais de lado para se manter focada nos jogos. “Desde antes decidimos que essa seria a melhor estratégia e foi a melhor coisa que eu fiz. Só fui ver as críticas depois”, conta.
Pois é, mesmo com uma carreira brilhante no vôlei de praia, apresentando os melhores resultados desde 2019 junto da dupla Ana Patrícia, Rebecca se viu frente a uma série de críticas sobre a sua forma física que, de acordo com alguns internautas, não se encaixa nos padrões de beleza.
“Eu procuro não me deixar levar”, continua. “As pessoas não me conhecem, não sabem da minha história, e acham que podem opinar dessa forma sobre mim. Eu sou uma atleta de alta performance, treino todos os dias, faço parte física, me dedico demais e eu conquistei a vaga olímpica junto com a minha parceira por méritos nossos. Nada nunca nos foi dado. Então, isso, de início, já deveria ser respeitado. O meu corpo não me define, assim como um corpo sarado não define quem o tem.”
Para ela, esses comentários são apenas uma expressão de pessoas que se acham no direito de dizer o que pensam sobre os outros, principalmente na internet. “Se jogo mal, todo mundo cai em cima, se jogo bem, todo mundo me enaltece. Então o caminho é não levar muito a sério nenhum extremo”, explica.
De qualquer maneira, Rebecca considera que saiu da última Olimpíada fortificada. Apesar das críticas, ela diz ter recebido uma “avalanche de carinho”, com mensagens positivas, e novos seguidores no Instagram. “As pessoas até hoje me mandam mensagem com saudade de me ver jogar na Olimpíada e isso é muito legal. No final, o apoio foi muito maior. Mas torço para que essa cultura mude”, fala.
Autocuidado de atleta: é possível?
Como uma atleta de alta performance, é de se imaginar que o tempo seja curto para rotinas de autocuidado, certo? Mas Rebecca explica que autocuidado é cuidar de si como um todo. “O cuidado não se resume só ao físico. Aliás, o mais importante é a nossa cabeça. A gente precisa, acima de tudo, estar bem com a gente mesma e com a nossa cabeça. Só assim consigo dar o melhor de mim”, diz.
Por isso, ela procura se manter equilibrada física e emocionalmente, contando com a sua equipe de apoio e médicos especializados. “Estou sempre em busca da minha melhor versão!”, brinca.
E os próximos passos?
Depois de Tóquio, Rebecca e Ana anunciaram o fim da parceria. Juntas desde 2017, elas conseguiram um título brasileiro e etapas no Circuito Mundial. Agora, gratas pela experiência olímpica, cada uma segue o seu caminho, ainda sem novas duplas definidas. Mas a meta, claro, são os jogos de Paris em 2024.
“Eu acho que só quem disputa uma Olimpíada entende o que é. É uma energia que não dá para explicar. O mundo inteiro reunido, os melhores do mundo, a vila olímpica é uma coisa que eu nunca vou esquecer na vida. Sai de Tóquio com aquele gostinho de quero mais. Então, meu plano é treinar muito para conseguir chegar lá de novo”, diz.
Com isso, não é sem motivos que Rebecca sente um carinho tão grande pelo esporte. Afinal, segundo ela, foi ele que trouxe a sua família e todas as experiências que a fazem mirar cada vez mais alto na carreira. “O vôlei me deu a minha família, então o vôlei é tudo para mim. E quero que seja cada vez mais, porque quero continuar conquistando títulos, representando meu país, meus patrocinadores e inspirando pessoas”, diz. “Carrego o meu Nordeste todo junto comigo, temos uma história forte no vôlei de praia que quero continuar semeando.”