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Espiritualidade prática, com Debora Pivotto

Espiritualidade e autoconhecimento conectados com a nossa saúde física e mental, com o coletivo e com a vida prática
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Por que a morte de Paulo Gustavo nos dói tanto?

Por Debora Pivotto
Atualizado em 21 out 2024, 22h28 - Publicado em 5 Maio 2021, 19h35
Paulo Gustavo: é o afeto que expressamos em vida que toca as pessoas. Essa é a marca que deixamos e que nos torna imortal.
Paulo Gustavo: é o afeto que expressamos em vida que toca as pessoas. Essa é a marca que deixamos e que nos torna imortal. (Reprodução Facebook/Divulgação)
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O Brasil está de luto pela morte do ator e comediante Paulo Gustavo, de apenas 42 anos. As lágrimas não param de rolar por aqui desde que soube da notícia. Estamos vivendo tempos tão difíceis, né? Há meses convivemos de forma meio anestesiada com a taxa surreal de cerca de 3 mil pessoas morrendo por dia de Covid no Brasil. Mas enquanto a morte é apenas um número, ela impressiona pelo volume, mas não nos toca. Já quando ela tem rosto, carisma, humor, dois filhos pequenos e um talento que poderia nos fazer rir por mais uns 40 anos, ela nos machuca muito.

A pandemia trouxe a morte para muito perto de todos nós. Eu diria que ela está esfregando o assunto na nossa cara, na verdade. E como é difícil lidar com isso! Pois essa relação mais próxima com a finitude nos faz lidar com diferentes tipos de sentimentos.

O primeiro que me deparei por aqui foi o medo. No começo, era um medo doido de pegar a doença. Por mais que eu só saísse de casa de máscara e estivesse de home office desde o início do isolamento social, lembro da tensão que fiquei nos primeiros meses ao sair para ir no mercado ou caminhar. Já achei que tinha pegado Covid inúmeras vezes. Chegava ao ponto de começar a tossir assim que chegava do supermercado – sintomas puramente psicológicos. Com o tempo, fui acalmando. Depois veio o medo de perder parentes próximos – mais especificamente meus pais. Ambos têm mais de 70 anos e trazem riscos como hipertensão e tabagismo. Dei uma pirada no início, queria obrigá-los a só fazer compras por delivery e ficava tentando controlar quem eles encontravam e onde iam. Mas, com o tempo, fui desapegando e entendendo que eles são responsáveis por cuidar das próprias vidas. E vê-los vacinados também ajudou a aliviar essa tensão.

Já a morte do Paulo Gustavo me trouxe sentimentos novos. Sinto uma tristeza profunda. E ao mesmo tempo, me sinto confusa por sentir esse luto por alguém que, na realidade, não conhecia. É complexa mesmo essa relação que temos com artistas com quem nos identificamos. Nunca os vemos pessoalmente, mas conhecemos tanto o trabalho deles e temos tanta admiração que, inevitavelmente, criamos um laço afetivo e uma sensação de intimidade. Eles fazem parte da nossa vida de alguma forma e temos um carinho enorme por eles.

E acho também que a morte de uma pessoa por quem temos afeto nos traz de forma mais concreta a consciência do que estamos perdendo com essa pandemia. Como eu, felizmente, não perdi nenhum parente ou amigo próximo por conta do Covid, não tinha sentido esse abalo de forma tão próxima. A gente lida com a paciência e a esperança de pensar que logo tudo isso vai passar, mas a verdade é que podemos retomar a rotina em algum momento, mas para mais de 400 mil famílias, a rotina nunca mais será a mesma porque muitas pessoas não estarão mais presentes. Estamos falando de mudanças definitivas, de luto, de dor. São processos muito profundos, que levam tempo para conseguirmos elaborar internamente.

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E junto com essa tristeza vieram também sentimentos de raiva e de revolta que estavam meio adormecidos por aqui. É inevitável pensar nessa hora de dor que essa morte poderia ter sido evitada se tivéssemos uma política eficiente de prevenção e um plano adequado e estruturado de vacinação. E é importante não fugir nem ignorar essa raiva porque só ela pode nos ajudar a fazer movimentos importantes – de cobrar os responsáveis por essas mortes e também de pensar de que forma eu posso colaborar de alguma forma para minimizar os estragos desse pesadelo coletivo que estamos vivendo.

Acho simbólica a morte de um dos humoristas mais populares do Brasil neste momento em que uma CPI investiga as ações e omissões dos governos na atuação durante a pandemia. Parece que não há mesmo espaço para o riso e o bom humor quando há tanta irresponsabilidade – dos políticos e de cidadãos comuns.

O legado que deixamos

Mas, além de todos esses sentimentos que estão emergindo aqui dentro, a pergunta que tenho me feito é: o que nos torna imortal? Que tipo de herança uma pessoa pode deixar no mundo que não permite que ela seja esquecida?

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E eu sinto que nos tornamos imortais a medida que expressamos o que temos de melhor dentro de nós, quando materializamos, seja na forma de arte, conhecimento ou de afeto, o amor que temos no nosso coração.

No caso de um artista com tanto talento e carisma como o Paulo Gustavo, é mais fácil de ver essa herança nos inúmeros personagens que ele fez no teatro, cinema e televisão. Essa expressão de afeto e de inteligência era visível, notória e pública. Mas isso também acontece em algum nível com todos nós.

Se você perguntar para alguém quais lembranças que ela guarda de uma pessoa querida que já morreu, ela vai citar uma comida especial que ela preparava, um abraço caloroso, um traço da personalidade que era marcante, um talento que ela tinha. Porque é o afeto que expressamos em vida que toca as pessoas. Essa é a marca que deixamos e que nos torna imortal.

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Depois de entender isso, percebi que quando choro vendo alguns vídeos do Paulo Gustavo é também porque fui tocada por todo esse afeto que ele manifestou enquanto estava vivo. A gente só chora a morte de quem um dia nos alegrou. Eu me conectei com ele, senti o amor e a irreverência que ele transmitiu e me dei conta do quanto fui muito nutrida e divertida por sua inteligência e pelo seu bom humor. Vejo que esse choro é também uma forma de honrá-lo e de expressar minha profunda gratidão.

Sou Debora Pivotto, jornalista, escritora e terapeuta. Trabalhei por 13 anos em grandes redações do país até descobrir que os assuntos que mais me interessavam estavam dentro – e não fora – das pessoas. Apaixonada por autoconhecimento e comunicação, faço uma espécie de “reportagem da alma” com a terapia de Leitura de Aura, ajudo as pessoas a reconhecer e manifestar os seus dons e talentos facilitando um processo de autoconhecimento chamado Jornada do Propósito, e estou me especializando em Psicologia Análitica Junguiana. Adoro compartilhar meus aprendizados em textos, vídeos e workshops. Para saber mais, me acompanhe pelo instagram @deborapivotto.  

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