As tendências adoecem
A febre das tendências tomou conta das redes, com personalidades express mudando quinzenalmente a skin das pessoas e enchendo guarda-roupas por aí
Desde a pandemia, fomos acometidos por uma urgência de novidades. Isso, é claro, repercutiu em todas as áreas da vida. Tudo que aprendemos a silenciar e acalmar no começo da pandemia ficou relapso quando começou a flexibilização.
Talvez seja a urgência de viver à flor da pele, do entendimento de que a vida é agora e aqui. Que bonito seria se esse sentimento repercutisse em nutrir o corpo, a alma, abraçar os nossos, viver experiências e sorrir somente…
Mas é claro que a indústria precisava de uma participação nisso, para mastigar uma boa fatia dos nossos sonhos.
Com essa urgência, a febre das tendências tomou conta das redes, com personalidades express mudando quinzenalmente a skin das pessoas e enchendo guarda-roupas por aí, lotando armários de identidades sem identificação com a ânsia de parecer alguém; o aesthetic virou o pote de ouro no fim do arco-íris e, os espelhos, estranhos íntimos.
Pertenço a um grupo, mas não me reconheço; na intimidade do reflexo o look final comunica confusão, fantasia e o ideal frustrante muitas vezes de comunicar o que não se quer.
Na mesma mão disso tudo, os aterros lotam de blusinhas da moda de quinze dias atrás, os brechós têm outro valor, o garimpo é barato e rápido para ser descartado na mesma velocidade em que surge uma trend nova. Mas as blogueiras com copos térmicos decorados recomendam que a cada troca de tendência você se hidrate, respire, pratique yoga, e esqueça que o nosso ar está acabando, look após look.
Aí você me pergunta, mas Amanda, você é contra as tendências? E eu te respondo: Não!
Eu sou a favor de propósitos, de tirarmos das tendências um pedacinho do que comunica a nossa personalidade, mas acima de tudo, entender: A que custo buscamos o pertencimento?
Pertencer aos olhos dos outros é fácil e é vendido nos e-commerce e fast fashion. É ensinado nas trends. A blogueira que você adora com certeza tem um manual para tal…
Pertencer a si mesmo é caro, custa olhar pra dentro e querer compreender e comunicar a própria linguagem e, sobretudo, lembrar-se do que é feito o pertencimento estético.
Quem fez a sua roupa? Quanto ganha quem fez sua roupa? Em que condições essas roupas foram feitas e, sobretudo, para onde vai todo esse pertencimento têxtil quando a nova onda aesthetic tomar as redes?
Talvez pensar: a rapidez das trends está levando além da nossa identidade. Está levando o ar que muitas vezes nos falta, durante a ansiedade de pertencer.