Tomar banho. Escovar os dentes. Lavar a louça. Lavar roupas, lençóis, até brinquedos. Lavar o rosto e as mãos (às vezes, muito mais de uma vez por dia). Fazer café, arroz, feijão… quem sabe um bolo. É fácil esquecermos (ou normalizarmos) o uso da água no nosso dia a dia. Vivemos no “planeta azul”, é o que dizem cientistas e astronautas, que observam o planeta coberto de água (salgada!) do espaço. Ainda assim, temos um sério problema com ela. Alguns, gastam demais. Outros, têm acesso de menos. Tomar dois litros de água por dia é um privilégio de poucos. O desperdício e a falta de cuidado com a água, um recurso que, já sabemos, é finito, tem se tornado latente e urgente. Entram aí uma série de soluções que, ainda que de forma tímida, ganham espaço em ambientes onde isso parecia impossível, como o mercado de cuidados com a pele – vide o crescimento exponencial da busca pela chamada “waterless beauty”.
O termo em inglês significa, em tradução livre, “beleza sem água”, e propõe exatamente o que diz o nome: são produtos livres de água, tanto em relação às embalagens, quanto à composição do próprio produto. Os shampoos se tornam sólidos (e, no exterior, podemos encontrar até versões em pó). Os sabonetes também. Desodorantes aparecem em bastão, às vezes em cristal. Até produtos mais específicos para a pele, como protetores ou hidratantes surgem em formatos novos que não precisam de água para serem desenvolvidos e embalados.
Produtos com base de água X Produtos sem água
O objetivo principal da indústria de beleza e cuidados com a pele ainda é o lucro e a alta durabilidade. Por isso, muitas vezes a água é usada como um ingrediente “extra”, que ajuda na rentabilidade de um produto, além de ser muito barato. Por outro lado, a água pode ser um prato cheio para a proliferação de bactérias que vivem e se desenvolvem no líquido, o que significa que até os seus produtos preferidos podem gerar questões de pele por causa dessas bactérias. Uma forma de minimizar esses efeitos é encher os vidrinhos de químicas que preservam a estabilidade desses produtos e ainda matam esses microorganismos indesejados.
Assim como alimentos cheios de pesticidas e produtos químicos usados nas lavouras podem afetar a saúde e o bem-estar de um ser humano, o mesmo vale quando essas químicas são utilizadas de outras maneiras, como para garantir a durabilidade de um hidratante para o rosto ou de um protetor solar. De disfunções hormonais mais sérias à pele ainda mais seca e opaca, a água não necessariamente é um ingrediente benéfico para produtos de skincare.
Isso, claro, sem considerarmos o impacto ambiental. Para produzir um quilo de plástico, por exemplo, são necessários 180 litros de água – e esse plástico não “desaparece” do planeta depois que você joga a embalagem de shampoo vazia no lixo. Segundo a divisão das Nações Unidas para o Meio-Ambiente, hoje, são jogados nos mares mais de 8 milhões de toneladas de lixo por ano e, se nada for feito para reverter tanto a produção quanto o descarte equivocado desses materiais, até 2050 teremos mais plástico do que peixes no oceano.
“Em geral, produtos livres de água dispensam embalagens plásticas por serem sólidos. Além disso, como a água cria um ambiente favorável a micro-organismos, sem ela como veículo, conservar aquele produto se torna mais fácil. Ainda, a porcentagem de ativos tende a ser maior, já que a água pode chegar a 80% da fórmula”, explica Nyle Ferrari, jornalista, autora e influenciadora especialista em beleza limpa e estilo de vida consciente. “Além disso, a economia de água tanto para fazer o produto quanto para embalá-lo, desde que seja livre de plástico, é gigante.”
Uma mudança efetiva nesse curso só pode ser feita com a ação direta das grandes indústrias e empresas, as principais responsáveis pela produção do plástico e gasto de água no mundo. Mas isso não significa que você não só pode como deve fazer a sua parte – e isso pode, além de tudo, fazer bem para a sua pele e para o seu cabelo também.
A era da beleza sem água
Para entender porque os produtos sem água têm crescido tanto no mercado, é preciso, primeiro, compreender o papel desse líquido na pele: “A água participa de muitas reações enzimáticas em nosso corpo”, explica a Dra. Marina Pipa, dermatologista da Clínica Vanité, em São Paulo. “Além disso, ela deve estar presente em níveis adequados. A epiderme é dividida em camadas. A camada mais superior é a córnea, que para ter uma aparência saudável e hidratada deve ter um teor de água superior a 10%, até o limite de 30%. A água perdida através da evaporação, principalmente nos dias secos, é reabastecida através da água presente nas camadas inferiores. Isso é conhecido como perda transepidérmica de água (TEWL).”
Se somos seres formados por 60% de água é de se esperar que o líquido seja, de fato, importante para a nossa sobrevivência. No entanto, ele não necessariamente é importante para a manutenção da saúde da pele, em sua forma superficial. Por isso, surgiu na Coreia do Sul, a campeã em pesquisa de produtos de pele e skincare, uma série de itens desenvolvidos para máxima eficácia nesse cuidado. Foi só recentemente, em 2015, que a tendência começou a cair no gosto do Ocidente e, hoje, ganha novos ares: mais do que a eficácia, a ideia é priorizar produtos de fácil transporte, sustentáveis e não tóxicos.
“Os produtos livres de água na forma sólida são extremamente econômicos, duram meses mais do que produtos líquidos”, continua Nyle. “A maior concentração de ativos também é um diferencial, agregando ainda mais benefícios para a fórmula. A única possível desvantagem é que, se a pessoa nunca usou produtos sólidos, pode ser que aconteça um estranhamento de início. Mas a adaptação é tranquila e os benefícios sem dúvida compensam.”
De acordo com a dermatologista, em termos de comparação, produtos com ou sem água não têm exatamente uma grande diferença nos resultados, mas é preciso um único cuidado: como disse Nyle, a concentração dos ativos é maior do que em um produto comum, em que a água funciona como solvente.
“A composição dos produtos deve ser avaliada como um todo para entendermos qual solvente foi utilizado, qual veículo, qual a concentração ideal dos ativos. Se simplesmente retirarmos a água de um produto, é possível que os ativos fiquem em uma concentração maior que a ideal e causem reações adversas, como dermatites de contato, que provocam vermelhidão, edema, descamação e ardência”, diz a Dra. Marina. De qualquer maneira, não existem contraindicações diretas a esses produtos, a não ser que a consumidora tenha alguma alergia conhecida aos princípios ativos utilizados na composição.
Vale ficar atenta também ao armazenamento desses produtos, para garantir a durabilidade e efetividade dos ativos concentrados. “O mais importante é manter o produto sólido bem armazenado, obrigatoriamente em uma saboneteira drenada para que não haja acúmulo de água. Também é vantajoso repartir o produto sólido ao meio e usar cada parte por vez, e manter a que ainda será usada bem guardada, longe de umidade, sol e calor excessivo”, finaliza Nyle.
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